"Incumprimento grego é condição necessária para a reforma da zona euro"

A Grécia está a fazer "o que tem de ser feito: testar o modo de funcionamento da União Europeia e da zona euro", defende em entrevista ao DN o historiador Robert Skidelsky.
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. Autor de uma obra de referência sobre John Maynard Keynes, Skidelsky participou nas Conferências do Estoril, onde falou sobre a desigualdade nas sociedades contemporâneas.

Perante o impasse nas negociações da Comissão Europeia, FMI e Banco Central Europeu com a Grécia, fala-se da saída deste país da zona euro. Isto teria consequências para a União Europeia (UE) ou tudo continuaria igual?

Teria de haver mudanças. Se a UE não consegue manter a Grécia na zona euro, devido ao modo como funciona, penso que outros Estados perguntar-se-ão se a UE funciona como deveria. O incumprimento da Grécia ou a sua saída da zona euro é a condição necessária para a reforma da UE e, em particular, da própria zona euro. Não digo que seja este o papel que a Grécia ambiciona, mas poderá ser a natureza das coisas a ditar este caminho. O pior desenlace que é concebível pode revelar-se necessário para se fazerem as reformas que têm de ser feitas. De outro modo, tudo continuará mais ou menos na mesma.

Que pode suceder já em junho?

Creio que aquilo que tiver de suceder não será no verão, haverá pequenas crises antes da crise real...

O governo da Grécia está a seguir o caminho correto?

Está a fazer aquilo que tem de ser feito: testar o modo de funcionamento da UE e da zona euro, em especial.

O que está a motivar a perpetuação da crise iniciada em 2007/8?

Para mim, é a contínua aplicação de medidas de austeridade antes de se ter conseguido a recuperação económica. Os défices deviam ter sido mantidos, ou aumentados, até o setor privado poder atuar quando se verificasse o início do aumento da procura. Deviam ter sido confrontados os detentores de dívida soberana dos países. Só que fazer isso na zona euro teria requerido uma ação enérgica da Alemanha e as preocupações eram outras...

Quais eram?

A Alemanha queria sair da recessão com o maior apertar do cinto possível, acreditando que seria recompensada a virtude dessa política. E há um outro fator muito importante: a Alemanha é uma poderosa economia nas exportações. Por isso, tiveram uma recessão breve. Ao mesmo tempo, o sudeste asiático e a China recuperaram rapidamente das suas próprias recessões e, no caso chinês, foi com um avultadíssimo programa de investimentos do Estado, muito maior do que nos EUA ou na Grã-Bretanha ou na UE. Isto contribuiu para a Alemanha sair rapidamente da recessão.

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